O Céu é o Limite
Olá leitor!
Segue abaixo uma interessante entrevista com o astronauta
brasileiro Marcos Pontes postada dia (09/11) no portal “DeFato Online”.
Duda Falcão
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ENTREVISTA / MARCOS PONTES
O Céu é o Limite
Astronauta, engenheiro, militar na reserva, escritor,
palestrante,
empresário e embaixador da ONU. Primeiro brasileiro a
sair da órbita
terrestre. Marcos Pontes é a prova de que a persistência
faz chegar longe
Rodrigo Andrade
09/11/2014 - 08h12
RENATO
CARVALHO/DEFATO
Marcos Pontes:
"Lembro que eu olhava
a cada dois minutos para a bandeira do Brasil
e pensava
assim: ‘não estou indo sozinho,
está todo mundo indo comigo"
|
29 de
março de 2006. Essa data ficará na história do país e especialmente marcada
para o astronauta Marcos César Pontes, 51 anos, o primeiro brasileiro a ganhar
o espaço. Ele estava a bordo da nave russa Soyuz TMA-8 e participou da “Missão
Centenário”, em referência à comemoração dos cem anos do voo do 14 Bis de
Santos Dumont. O pioneirismo, no entanto, foi precedido de muitas dificuldades
e decisões difíceis de serem tomadas. Foi preciso persistência.
Marcos
Pontes é de família humilde de Bauru, interior de São Paulo. Estudou em escola
pública, fez curso técnico de eletricista e com dedicação conseguiu entrar para
a Academia da Força Aérea (AFA), onde recebeu bacharelado em tecnologia aeronáutica.
Lá dentro, percebeu que poderia subir mais degraus se estudasse mais. Formou-se
em Engenharia Aeronáutica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e
depois adquiriu mestrado em Engenharia de Sistemas pela Naval Postgraduate
School, da Califórnia.
Marcos
Pontes acumulou patentes na Aeronáutica Brasileira e se tornou piloto de testes
de caças. Foi quando surgiu a oportunidade de prestar concurso público para ser
astronauta. Tentou a sorte e se deu bem. Mas veio a decisão mais difícil. Para
ingressar no projeto espacial, teria que abrir mão da bem sucedida carreira
militar. No fim, pesou o sonho de criança de ver as estrelas de perto.
O
astronauta esteve em Itabira no dia 15 de outubro para a palestra de abertura
da I Congresso de Iniciação Científica e Tecnológica de Itabira, realizado pela
Unifei. Antes do evento, conversou com DeFato sobre a carreira,
importância da educação e de investimentos públicos em áreas fundamentais para
o desenvolvimento do país. O resultado está na entrevista a seguir.
Como um
técnico eletricista foi parar no espaço?
Com
educação. O pessoal que me conhece fala que eu sou obcecado por educação e não
é atoa. É que eu acho que a melhor ferramenta para reduzir a diferença social
que existe é a educação, porque ela permite que as pessoas através do próprio
esforço consigam realizar seus sonhos. Eu comecei como toda criança, sonhando.
Acreditei neste sonho e tive o incentivo necessário, isso é importante. Contei
com a família e com os amigos. Estudei, fui para a Força Aérea e lá resolvi não
continuar na carreira normal, vamos dizer assim. Resolvi aproveitar as
possibilidades que a Força Aérea dá de você estudar mais. Fui piloto de caça e
depois fiz o ITA e me tornei engenheiro. Aí eu somei as duas coisas para ser
piloto de testes, resolvi fazer mestrados e doutorado e continuar sempre a
estudar. Isso me permitiu formar um currículo que era muito semelhante – e
logicamente fiz isso de propósito, porque já sonhava com isso – aos dos
astronautas americanos. Então, quando a NASA abriu uma turma nova de
astronautas em 1998 e exigiu do Brasil um recurso humano, eu estava exatamente
qualificado para aquilo. Eu participei do concurso público, fui selecionado e a
partir de então entrei nessa carreira de astronauta. Foram dois anos de curso
para me formar astronauta profissional e depois vários anos de espera até ser
escalado. Muita água rolou por debaixo da ponte até lá. Finalmente fiz a missão
em 2006, voltei para Huston e continuo à disposição do Brasil para outras
missões, embora isso seja um tanto improvável no presente momento.
Para ser o
primeiro astronauta brasileiro, você precisou tomar uma decisão difícil. Como
foi abandonar a carreira militar para se dedicar ao sonho de ir ao espaço?
A vida da
gente é feita de decisões, né. E em alguns momentos você tem que tomar uma
decisão radical. E não é fácil. Eu uso sempre alguns princípios, algumas
diretrizes, para tomar decisões. Eu sou colch também, trabalho com isso,
então você acaba passando isso para outras pessoas. Mas, basicamente, você
primeiro sempre tem que usar o seu time principal. E quando eu falo time
principal é a família. Usar a família para te ajudar a tomar decisões. Segundo,
sempre tomar decisões em acordo com seus valores. E no meu caso, como piloto de
combate da Força Aérea, os valores são coragem, lealdade, honra, dever e
pátria. Realizar essa missão, entrar para um programa espacial como astronauta
estava de acordo com esses valores. Eu sabia que aquilo iria praticamente
encerrar minha carreira militar, que era uma carreira que eu sonhei muito, e
que eu estava colocando meu pé em um barco que eu não sabia exatamente para
onde iria. Mas eu tinha a chance de remar. Foi pensando nisso que eu aceitei.
Não foi uma decisão fácil.
29 de
março de 2006. O que esse dia significa para você?
Parece o
dia do casamento. Não sei se você é casado, mas é igualzinho. Você tem uma
série de expectativas e uma série de ideias. E você passou por uma série de
dificuldades até chegar naquele ponto. E de repente, quando você está sentado
ali, parece que passa um filme em câmera lenta e você vai lembrando cada
detalhezinho. Foi um dia muito marcante na minha vida. Lembro que eu olhava a
cada dois minutos para a bandeira do Brasil e pensava assim: “não estou indo
sozinho, está todo mundo indo comigo”. Aquela era uma sensação muito boa, de
cumprir uma missão para o país. A minha vida toda eu tenho cumprido missões
para o país. E ali poderia dar certo, eu cumprir a missão e voltar realizado,
como aconteceu, ou poderia parar tudo no início. Eu estava sentado em duzentas
toneladas de combustível. Mas, de qualquer forma, de uma maneira ou de outra,
ficaria sempre a marca de que eu estive lá, eu não tive medo. Ou melhor, eu
tive medo, mas tive coragem de encarar o desafio e fazer o que precisava ser
feito.
Em muitos
posicionamentos, você aborda as críticas que foram direcionadas aos
investimentos feitos pelo Brasil na sua viagem ao espaço. Empreitadas como
essas são pouco valorizadas no país?
Infelizmente
ainda são. A marca de um país desenvolvido é o valor que ele dá a três coisas:
educação, ciência e tecnologia. Pode prestar atenção em todos os países
desenvolvidos e observe como que essas três coisas são extremamente
valorizadas. A NASA tem uma conta muito simples. Ela afirma que para cada dólar
investido no programa espacial, você tem cinco dólares de retorno social. É
dito que os Estados Unidos é o país mais capitalista do planeta e se você for
usar simplesmente a lógica, significa que um país capitalista vai investir
sempre pensando em retorno do investimento. Nenhum capitalista vai investir às
cegas ou a fundo perdido. Se os Estados Unidos investem mais de 20 bilhões de
dólares em um programa espacial por ano, não deve ser atoa. O que eu vejo no
Brasil é que a gente ainda está muito aquém daquilo que a gente poderia estar
em termos de prioridade para a parte de ciência e tecnologia, especialmente em
como transmitir educação e conhecimento científico para produtos. A gente tem
muitos pontos quebrados e precisamos resolvê-los se a gente tem – e eu espero
que tenha – objetivo de se tornar um país desenvolvido.
O senhor
falou das cifras bilionárias que os projetos espaciais exigem. O que o espaço
pode proporcionar à humanidade e que justifique tantos aportes?
O que
existe na verdade é um desconhecimento de muita gente a respeito do que o
espaço já tem trazido para a humanidade. A gente está falando aqui com
equipamentos que certamente são derivados de pesquisas espaciais. Pouca gente
sabe disso, o que é um problema sério. Vamos pensar em Brasil. A gente tem um
país muito grande, que precisa ter proteção de fronteiras. Isso pode ser feito
por satélite. A gente precisa desenvolver remédios e novos produtos, e isso é
feito comumente no espaço. O Brasil precisa ter uma agricultura forte, sem
invadir áreas de preservação, o que pesquisas no espaço permitem fazer. Eu sou
embaixador da ONU e lá a gente trabalha em torno de temas que sempre têm a ver
em como utilizar a ciência e a tecnologia para desenvolver o país. O programa
espacial é chave para um país do nosso tamanho. Se você falar de um país
pequeno, como Uruguai, Paraguai, Equador, é diferente a situação. É necessário
o programa espacial e ao longo da história a gente tem usado esses
conhecimentos. Só que as pessoas não notam muito isso e, infelizmente, o Brasil
está perdendo o seu programa espacial.
Como está
hoje o Programa Espacial Brasileiro? Há chances de você voar novamente, ou de
termos outro astronauta?
Eu não vou
falar que a chance é zero porque é muito categórico. Mas eu diria muito próximo
de zero. O programa está encolhendo. A gente tem algumas parcerias
internacionais, mas mesmo essas são difíceis de manter em termos de recursos e
outras coisas. Chance de voar, eu diria que quase nada. Outro astronauta,
então, é quase nada ao quadrado. Mas hoje em dia, nos outros países que já
estão chegando um pouco mais a frente existe um movimento muito grande em torno
do desenvolvimento do setor privado e isso vai abrir perspectivas para
astronautas profissionais em muitas empresas. Com isso, eu tenho essa
possibilidade em outros países, mas eu não queria fazer isso, preferiria voar
pelo Brasil.
No Brasil
a gente ainda se espanta quando surge a notícia de um brasileiro fazendo algo
extraordinário. Por que é assim?
É uma
questão de atitude. A gente precisa ter uma atitude de mais confiança com
relação ao país e com as coisas que a gente tem. A gente não fica para trás de
outros países em muitas coisas. Claro que temos problemas a ser resolvidos, mas
isso não quer dizer que a gente não possa ter pessoas no Brasil capazes de
fazer e bem melhor do que pessoas de fora. Então, é uma questão de atitude e
acho que isso precisa começar a ser desenvolvido nas crianças. O fato é que a gente
consegue, sim, fazer muitas coisas boas aqui e fora do Brasil. Nós temos
pessoas excelentes, e olha que eu passo muito tempo lá fora. Eu conheço vários
brasileiros que dão show lá fora. Infelizmente, dentro do Brasil os caras são
menos conhecidos. Um desses caras é o Miguel Nicolelis (cientista brasileiro
desenvolvedor do exoesqueleto). Lá fora ele é muito conhecido e respeitado.
Todos viram o que ele fez na abertura da Copa. Em minha opinião, aquilo era até
mais importante que os jogos, vai mudar a vida de muita gente.
Em Itabira
você participa do I Congresso de Iniciação Científica e Tecnológica da Unifei,
que é uma instituição federal. Como você avalia o investimento brasileiro nessa
área?
Assim como
o programa espacial, toda área de ciência e tecnologia está de certa forma
esquecida ou prejudicada. Isso causa, infelizmente, certa disputa por
orçamentos. Ao invés das instituições cooperarem, o que seria muito mais
interessante, existe uma disputa por orçamento. E isso acontece pela própria
estrutura que existe dos financiamentos de projetos. Ainda existe uma
dificuldade de direcionar os orçamentos de acordo com as tecnologias críticas
para o país. Existe uma distância muito grande entre a academia, os centros de
pesquisas e as indústrias. Tem um buraco e o resultado disso é a diferença que
existe entre o número de papers escritos nas universidades e o número de
inovações que resultam desses papers. Ou seja, a gente está produzindo
muita coisa que não vai se tornar nada. E a gente precisa mudar esse número.
Precisamos da pesquisa pura, sem dúvida nenhuma, mas precisamos também da
pesquisa aplicada. Pesquisas que se transformem em inovações, que vão se
transformar em produtos, que vão se transformar em empresas, que vão se
transformar em empregos. E também precisa haver ferramentas que permitam às
universidades públicas receberem dinheiro de empresas e pessoas físicas, como
existe nos Estados Unidos e em outros lugares. No Brasil é uma dificuldade
enorme.
E tem
solução?
A gente
precisa de uma aproximação um pouco maior da academia com a vida real, com as
coisas que estão acontecendo. São duas razões. Uma delas é a aproximação maior
em termos de projetos e recursos; e a outra é que melhora a formação dos
profissionais. A universidade tem como função básica formar profissionais para
o mercado de trabalho. Claro, você forma acadêmicos também, mas é um percentual
muito pequeno. E só existe uma maneira de formar o profissional adequado para o
mercado de trabalho hoje: a aproximação da academia com o mercado. Só assim
veríamos se o material que está sendo produzido é o que deveria ser produzido e
conseguiríamos reduzir essa diferença.
A sua
palestra é sobre gestão de carreiras. Como está a sua hoje? Dedica-se somente a
palestras?
Eu tenho
muitas atividades, aliás, mais do que eu gostaria. Estou tentando cortar
algumas. Na função de astronauta, eu tenho alguma atividade em Huston, de vez
em quando, alguma escala em Kennedy que a gente precisa cumprir e contatos que
faço como representante técnico. Relativamente é simples de cumprir, mas se eu
for escalado, tudo muda. Além disso, tem a parte da ONU. Eu sou embaixador e
isso demanda um tempo grande, porque fico em Viena de vez em quando e dali vou
para outros países para propor projetos. Aliás, é uma coisa interessante, eu
tenho muito mais influência fora do Brasil, como embaixador da ONU, do que aqui
dentro. Tenho uma fundação em São Paulo que também exige certo tempo para
cuidar. Eu tenho empresas, inclusive uma de turismo de aventuras que faz voos
suborbitais, voos na estratosfera e mais um monte de coisa. Faço palestras,
dentro e fora do Brasil, escrevo livros e dou aulas na USP, em São Carlos, na
Escola de Engenharia. Estou muito amarrado em vários afazeres e ultimamente
isso está meio complexo. Estou pensando em onde posso dar uma limada para
reduzir.
Alguma
outra consideração?
Eu só
queria acrescentar o seguinte: é importante esse tipo de evento para trazer
certos assuntos à tona, relativos a carreira dos jovens. E uma coisa que é
importante também – e eu notei isso nessa minha experiência em ser candidato a
deputado – é que existe uma alienação muito grande no meio universitário com
relação à política. Isso me espantou. Me deu medo, para falar a verdade. Se
existe essa alienação no meio que é considerado intelectual, a gente está em
uma proa muito ruim. A gente precisa discutir mais esses assuntos. E o que eu
sinto é que, de certa forma, as organizações têm um medo enorme até de falar a
palavra política no meio dos jovens. E é necessário falar de política. A gente
vive em um meio político e é preciso debater. Não estou falando de ideologia,
porque sou completamente contra colocação de qualquer tipo de ideologia, seja
de esquerda ou direita. Mas é importante que eles saibam o que existe, que eles
saibam o que acontece e que eles participem. A gente precisa formar pessoas que
se interessem pela política e que adotem a política não como uma carreira, mas
como uma missão honrosa.
Fonte: Portal DeFato Online- http://www.defatoonline.com.br
Comentário: Parabéns Marcos eu compartilho de suas
opiniões, mas creio que o meu otimismo em relação a uma mudança no Brasil seja hoje bem menor do que o seu, eu diria beirando ao zero absoluto. O
Brasil é um território de tribos condenado a jamais ser uma nação de verdade, e
muito menos uma nação desenvolvida. O Brasil caminha cada vez mais para se tornar
um porto seguro para a incompetência dirigida e para impunidade legal, um verdadeiro território de Piratas. Infelizmente caro amigo esta é a realidade brasileira.
Duda sei que você pensa de modo diverso, mas quando vejo esse cara aí me lembro do triste episódio que acompanhei passo a passo na esperança de que o Brasil ia se desenvolver na área espacial : a ida de Lula a Moscow em outubro de 2005 .
ResponderExcluirO molusco cachaceiro só foi lá para aparecer politicamente para o mundo, tirar fotos junto com Putin, sem nenhuma intenção de desenvolver o Brasil na área do espaço.
E dizia textualmente: "o Brasil será uma potência espacial".
Ele havia protagonizado a mesma palhaçada em maio de 2004 em Kiev com o presidente L. Kutchma da Ucrania.
Embora Lula tenha feito coisas importantes para o Brasil, na área espacial foi uma nulidade.
Olá Iurikolev!
ExcluirQuanto ao LULA realmente você esta certo. Quanto ao Marcos, não, mas enfim... O único erro dele foi ter nascido no Brasil, mas este erro não cabe a ele.
Abs
Duda Falcão
(Blog Brazilian Space)
Duda,
ResponderExcluirIsso talvez ajude a explicar esse caldo cultural, ainda não bem temperado, que é o Brasil, quem sabe um dia vire nação...
https://www.youtube.com/watch?v=YFbzvZDmdMI
Abs,
José Gustavo