Defesa Alijou INPE do SGDC, diz Raupp
Olá leitor!
Segue abaixo uma interessante entrevista com o ex-ministro
Marco Antônio Raupp postada na da edição de nº 31 do “Jornal do SindCT”. Vale a
pena dar uma conferida.
Duda Falcão
Entrevista
Defesa Alijou INPE do SGDC, diz Raupp
Fernanda Soares
Jornal do SindCT
Edição nº 31
Agosto de 2014
Ex-ministro nega conflito de interesses no Parque
Tecnológico de São José dos Campos e afirma que projeto não pretende concorrer
com INPE e sim realizar interlocução entre setor privado e o setor público O
ex-ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antônio Raupp, recebeu o
Jornal do SindCT para uma entrevista exclusiva, no final de julho, nas
dependências do INPE.
Na entrevista, Raupp deixa clara sua intenção de apoio às
instituições privadas com seu retorno ao Parque Tecnológico de São José dos
Campos, ao mesmo tempo em que alega que a finalidade não é concorrer com os
institutos públicos de pesquisa, mas firmar parcerias construtivas com eles. Ao
responder a um questionamento sobre a não reposição de quadros nas instituições
federais de pesquisa, o ex-ministro destacou o fato de que nos governos Lula e
Dilma “o Estado priorizou os programas sociais, como Bolsa-Família e o
crescimento do salário-mínimo”, acrescentando: “Não existe um governo que tenha
contratado mais nas universidades e pesquisa em universidades do que o governo
Lula e o governo Dilma”.
Ele defende, na entrevista, o modelo adotado pelo projeto
SGDC e a criação da Visiona, aos quais diz apoiar “integralmente”. Raupp deixa
claro que os próximos satélites geoestacionários a serem contratados à Visiona
também não serão produzidos no Brasil, mas apenas testados nas dependências do
INPE. “Esperamos que no segundo, terceiro e quarto [satélites] o que puder ser
testado no LIT será trazido para o INPE, para ser testado aqui”, afirma o
ex-ministro. Por fim, Raupp defende que o Brasil assine um acordo de
salvaguardas com os EUA para a utilização da base de Alcântara, acordo este
proposto no governo FHC, mas que foi negado pelo Congresso Nacional e
engavetado por Lula por ferir a soberania do país sobre seu próprio território.
O senhor fez parte do comitê que criou o Parque
Tecnológico de São José dos Campos e também fez parte da organização social
(OS) criada para gerir o Parque. Houve conflito de interesses? Houve
favorecimentos?
Eu fiz parte de um grupo de trabalho que estruturou a
organização do Parque. Criaram um comitê da Prefeitura e eu não era funcionário
da Prefeitura. O Comitê da Prefeitura fez a licitação para escolher a OS, isso
foi separado. Foi questionado na Justiça, mas foi recuado [sic], porque foi
feito dentro da lei.
Como vê projetos do Parque Tecnológico que estão
esvaziando os institutos, como o INPE? Uma coisa deve concorrer com a outra?
Eu vejo exatamente o contrário. O Parque Tecnológico foi
feito para estimular os projetos das instituições de pesquisa que têm interação
com as empresas. Por exemplo, o ITA quer criar um Centro de Inovação
Tecnológica, que prevê a integração da empresa. Então pode usar a
infraestrutura do Parque Tecnológico, pode se instalar lá e desenvolver os
projetos e parcerias. É um órgão criado para estimular as parcerias entre
institutos e empresas, não é para substituir.
Lá não vai ter laboratórios dedicados à pesquisa. O
Sindicato [SindCT] esteve bastante equivocado em relação ao Parque Tecnológico,
achando que o Parque iria substituir entidades de pesquisa aqui de São José dos
Campos. Não é isso. É para criar mais oportunidades. Espero que o Sindicato um
dia entenda. O Sindicato também se mostrou contra a forma de organização em OS
para gerenciar o Parque.
Não pode ser feito de outra forma, não pode ser uma
organização estatal dentro de uma administração direta, porque ela promove a
cooperação entre empresas privadas e estatais.Uma entidade puramente estatal
dificilmente consegue fazer cooperação com entidade privada, o Parque faz essa
relação, e com fiscalização do setor público.
O PL 2.177 irá colaborar com essa integração?
Sim, totalmente.
O fato de pesquisadores de instituições poderem ser
cedidos para pesquisas privadas não as prejudica?
Isto não esvaziará ainda mais as instituições de pesquisa?
O servidor é cedido parcialmente, um exato número de horas. Ele vai poder
dedicar um certo número de horas do seu trabalho a esse projeto. Sou favorável
a isso. Só em casos excepcionais ele ficaria em tempo integral. Isso está
previsto na Lei de Inovação, mas é difícil de implementar.
Pode ocorrer favorecimento à iniciativa privada?
A obrigação de fazer esse balanço é de quem executa a
lei, dos dirigentes da empresa pública. De fazer com que as colaborações dele
não vão destruir seus próprios objetivos. A Lei não prevê essas coisas, mas
prevê limites para universidades, que estão sendo discutidos. Por exemplo, o
servidor pode dedicar um dia por semana, ou 5 horas por semana. O governo
defende interesse público. A instituição pública é que irá determinar quanto
desses projetos irá executar. Depende de sua capacidade e seu interesse no
projeto. Um projeto que não contribui em nada para os interesses da entidade
não deve ser feito por ela.
Por que o esvaziamento das instituições de pesquisa, a
falta de concursos para repor pessoal, a falta de investimentos nas
instituições?
A administração de pessoal é feita pelo Ministério do
Planejamento. É uma decisão de governo, depende de uma série de parâmetros, as
condições em que vai efetuar a contratação, avaliação da instituição, e das
opções econômicas, se o Estado tem condições de contratar mais. Nós estamos
vivendo períodos, há muito tempo, em que o Estado tem dificuldade em contratar,
por causa de prioridades.
Nos governos Lula e Dilma, o Estado priorizou os
programas sociais, como Bolsa-Família e o crescimento do salário-mínimo.
Priorizaram investimentos em educação, com expansão de universidades federais,
contratação de professores e a criação do Prouni. Na C&T não houve essa
prioridade. Educação e Saúde são sempre maiores prioridades. É o que a
população quer, mais do que pesquisa científica. É uma decisão da sociedade,
não do governo. Na questão de contratação, temos que olhar mais amplamente. Não
existe um governo que tenha contrata- do mais nas universidades e pesquisa em
universidades do que o governo Lula e o governo Dilma.
Qual a avaliação até o momento sobre a Visiona e a compra
do satélite geoestacionário SGDC? Os técnicos do Brasil que foram enviados para
a Thales Alenia de fato vão conseguir assimilar tecnologias novas?
Eu apoio integralmente esse modelo, criando essa empresa
integradora, que seria a negociadora com as empresas estrangeiras. Só acho que
deveria ser mais rápido, pois estamos vivendo uma crise financeira, o governo
não está liberando recursos, isso diminui um pouco o avanço do projeto. Defendo
integralmente esse modelo. Pode ser um impulso para o Programa Espacial
Brasileiro. Os técnicos brasileiros estão assimilando as tecnologias. O
programa começou este ano, as pessoas estão fazendo cursos e trabalhando nessas
empresas, obviamente estão absorvendo tecnologia.
O que faltou na Ucrânia (ACS) está ocorrendo aqui deste o
início. Está prevista alguma participação do INPE?
Esse primeiro satélite terá uma grande participação da
Thales Alenia, mas essa participação será administrada pela Visiona. Esperamos
que no segundo, terceiro e quarto (porque isso é uma família de satélites) o
que puder ser testado no LIT será trazido para o INPE, para ser testado aqui.
Não foi pensado em uma sequência de satélites para a
Thales Alenia, mas para a Visiona. Quem irá operar esse satélite é a Telebrás,
não interessa ao INPE operar um satélite de telecomunicações, então foi
realizado um arranjo diferente. A Telebrás quis ter uma participação acionária
na empresa integradora. E no programa de capacitação, há também capacitação
para as empresas para participarem como fornecedoras dos próximos satélites. O
INPE ficou desconfiado porque o projeto não foi colocado sob sua
responsabilidade. Mas não foi [colocado] porque o dono do satélite de
telecomunicações é a Defesa.
Na sua opinião, como deveria se dar o contrato para a
fabricação do satélite CBERS-4A? Deveria ser nos mesmos moldes dos contratos
dos CBERS-3 e 4 (geridos diretamente pelo INPE), ou nos moldes da contratação
do SGDC (contratando- se uma empresa integradora privada)?
Nós fizemos um enorme esforço no desenvolvimento do CBERS
e todos os engenheiros do INPE são unânimes em responder que esse último foi o
melhor e mais qualificado, mas tivemos o azar do problema no lançamento. O
contrato da forma como está é perfeito, com o INPE como main-contractor.
A ACS não trará retorno financeiro ao país, muito menos
transferência de tecnologia. Por que investir tanto dinheiro numa empresa que
só gera benefícios à Ucrânia?
O retorno que tem é dar a capacidade ao Brasil de lançar
foguetes do porte do Cyclone, isso é importante estrategicamente. Foi
justificado com base em um projeto comercial, [mas] eu, particularmente, não
vejo possibilidades de ter retorno financeiro que justifique o projeto. A
justificativa é estratégica.
O projeto precisa ser reavaliado. Para a utilização da
base é necessário o acordo de salvaguardas. Com a Ucrânia já foi feito, mas
precisa fazer com os Estados Unidos, que é exatamente igual ao da Ucrânia e
acho que não vai ser feito tão cedo. E sem isso é impossível usar a base. Não é
possível transferir tecnologia, principalmente devido ao acordo de
salvaguardas. Mesmo assim os ucranianos sempre ofereceram a participação de
brasileiros nas instituições ucranianas. E muito pouco foi feito nesse sentido.
Não tivemos a capacidade de enviar técnicos para trabalhar lá.
Não tem o acordo de transferência de tecnologia, mas se a
gente tivesse a capacidade de enviar os técnicos nas oportunidades que nos
deram, e eles absorverem a tecnologia, seria quase a mesma coisa. Mandamos
apenas algo em torno de seis pessoas, infelizmente. Agora, com a crise na
Ucrânia, tem que ter uma pausa para a meditação. Parar o investimento e esperar
o que pode acontecer.
A fusão INPE-AEB foi descartada?
A gente perdeu oportunidades, deveria ter ocorrido uma
congregação maior entre o INPE, a Agência Espacial e o MCTI. Eles não quiseram,
eu queria. E tem um modelo que funciona aqui que é o modelo nuclear, é a
Comissão Nacional de Energia Nuclear [CNEN] e os seus institutos nucleares. É
um modelo estabelecido. O que eu estava propondo era fazer nesses moldes.
Qual o motivo da sua saída do MCTI?
A presidente [Dilma Rousseff] armou uma nova estrutura
política, são arranjos políticos para eleição.
Qual foi o maior desafio no MCTI? E a maior realização?
Desafio foi valorizar a C&T num contexto global.
Caminhamos bastante aí. Criei a Empresa Brasileira de Pesquisas Industriais
(Embrapi) para estimular parcerias entre as empresas, universidades e
institutos de pesquisa. A sociedade vai avaliar bem os benefícios dessa
cooperação. A criação do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de
Desastres Naturais (Cemadem) — ninguém tem dúvida dos benefícios do Cemadem,
dos alertas às comunidades prevenindo catástrofes. Teve também a criação do
Instituto Nacional de Pesquisas Oceanográficas (INPO) para articular toda a
pesquisa oceanográfica que é feita nas universidades.
O oceano é uma área estratégica, precisamos estimular as
pesquisas oceanográficas. Fizemos também a compra de um navio oceanográfico. Na
minha gestão cresceram os investimentos em C&T, o orçamento cresceu. Em
2011 era R$ 7 bilhões, passamos para R$ 12 bilhões em 2013. A soma das
iniciativas quase que dobrou. Alguma frustração? A gente sempre quer fazer mais
do que faz, operar orçamentos maiores. Eu até aumentei o orçamento, mas ainda
não fiquei satisfeito.
E em relação aos institutos de pesquisa eu esperava fazer
muito mais. Deveria haver uma nova formulação, uma nova estrutura de trabalho
para os institutos. Sempre defendi que os institutos devem ser nacionais,
trabalhar em projetos de interesse da política de C&T e se alinhassem com
as secretarias dos setores onde atuam. Por exemplo, o INPE alinhado com a
Agência Espacial, o INPA com a Secretaria de Meio Ambiente. Eu tinha a
expectativa de fazer esse alinhamento e os institutos direcionassem seus
trabalhos às secretarias. Se eu ficasse mais dois anos lá, eu sairia muito mais
satisfeito.
O Sr. já foi diretor do INPE e do Parque Tecnológico,
presidente da SBPC e da Agência Espacial, ministro da C&T. Onde teve sua
maior realização pessoal?
No INPE. Aqui eu fiquei um tempo adequado, quatro anos,
um tempo bom. E aqui, junto com colegas, fizemos uma reorganização da
Engenharia Espacial e das carreiras. Os projetos CBERS e MACB deram um grande
salto. E também pude criar o CPTEC, uma instituição importantíssima para o
país, com a ajuda do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Não fiz
sozinho, fiz com pessoas da área. E agora pude estimular o Carlos Nobre na
criação do Cemaden, que é uma continuidade do trabalho de previsão, mostra o
impacto que as condições climáticas farão sobre determinadas regiões. Tenho a
grande satisfação em dizer que criei oportunidades para o INPE e fora do INPE.
Irá mesmo retornar ao Parque Tecnológico? O que pretende
realizar no Parque?
Já fui aprovado pelo Conselho de Administração, ao final
de maio, quando terminou o mandato do Horácio [Forjaz]. Para o novo mandato foi
sugerido meu nome, mas devo esperar a “quarentena”. Pretendo criar
oportunidades para cooperação das instituições tecnológicas com as empresas.
Essa é minha filosofia para o Parque Tecnológico. O Parque não será o dono de
projetos, ele abriga e estimula os projetos de cooperação.
Fonte: Jornal do SindCT - Edição 31ª - Agosto de 2014
Comentário: Pois é caro leitor, essa foi a entrevista que
o SindCT fez com o Raupp, e em minha opinião alguns pontos defendidos por ele
são positivos, mas num contexto global a sua postura de agora e de quando era ministro
foi a pior decepção que tive desde que acompanho o PEB. O Raupp entrou com um
discurso e saiu com outro e realmente amarelou e deixou-se sucumbir pelo poder.
Extremamente lamentável o que aconteceu com este senhor que era possuidor de carreira
exemplar até chegar à Brasília, mas parece que, quem se muda para a nossa
obscura Capital Federal se transforma, e para pior, não sendo por acaso a total
situação de desgoverno em que o país se encontra. Chamo principalmente atenção do leitor para o que ele diz sobre a ACS, a Visiona e sobre os planos para os satélite SGDC. Lamentável!
Estranho seria uma pessoa se aliar a esses "governos" aceitar um cargo dado por eles e não sair elogiando... Bem típico.
ResponderExcluirNo caso é uma entrevista de um funcionário público que chegou ao nível de ministro, conduzida por um sindicato que defende os interesses de uma determinada classe de funcionalismo público.
Eu não vejo muito cabimento nisso, mas enfim...
Seguem algumas "seleções" da entrevista:
ResponderExcluir"Uma entidade puramente estatal dificilmente consegue fazer cooperação com entidade privada".
"O servidor é cedido parcialmente, um exato número de horas. Ele vai poder dedicar um certo número de horas do seu trabalho a esse projeto".
"O governo defende interesse público. A instituição pública é que irá determinar quanto desses projetos irá executar".
"A administração de pessoal é feita pelo Ministério do Planejamento. É uma decisão de governo, depende de uma série de parâmetros, as condições em que vai efetuar a contratação".
"Nos governos Lula e Dilma, o Estado priorizou os programas sociais, como Bolsa-Família e o crescimento do salário-mínimo. Priorizaram investimentos em educação, com expansão de universidades federais, contratação de professores e a criação do Prouni. Na C&T não houve essa prioridade". !!!
"O INPE ficou desconfiado porque o projeto não foi colocado sob sua responsabilidade. Mas não foi [colocado] porque o dono do satélite de telecomunicações é a Defesa".
"O retorno que tem é dar a capacidade ao Brasil de lançar foguetes do porte do Cyclone, isso é importante estrategicamente. Foi justificado com base em um projeto comercial, [mas] eu, particularmente, não vejo possibilidades de ter retorno financeiro que justifique o projeto. A justificativa é estratégica".
"Mesmo assim os ucranianos sempre ofereceram a participação de brasileiros nas instituições ucranianas. E muito pouco foi feito nesse sentido. Não tivemos a capacidade de enviar técnicos para trabalhar lá".
"A presidente [Dilma Rousseff] armou uma nova estrutura política, são arranjos políticos para eleição".
É uma pérola atrás da outra.